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13 de abril de 2008

Desconheço o autor da imagem

Saí com o desejo de me perder, de fazer caminhos novos. Pensava vagamente em meter-me por becos escondidos e ruelas estreitas, subir escadinhas por onde às vezes passo e me despertam a curiosidade, e saciá-la, passear em jardins desconhecidos, seguir os meus passos distraídos.
Mas não aconteceu exactamente assim. Parei por instantes a ver os livros usados de uma montra que já sei de cor e, casualmente, reparei no homem que estava dentro da loja. Parado junto a uma estante, segurava nas mãos um livro que não folheava ou tampouco olhava, apertando-o apenas com força. E uma expressão distante no rosto de náufrago. Ocorreu-me que, mesmo se avistasse um barco permaneceria quieto, sem manifestar a sua presença, porque era o livro que realmente o salvava.

Fiquei ali, à espera. Aquele homem tornara-se um obstáculo ao meu passeio sem destino, e eu não pretendia contorná-lo.
Passou tempo que não contei até ele sair da livraria. Quando passou por mim, os nossos olhares cruzaram-se por um instante, o suficiente para me mostrar que o náufrago subitamente era eu, debatendo-me nas profundezas negras daqueles olhos, que brilhavam no rosto cavado, de feições acentuadas. Ele seguiu ausente, estava muito longe dali, era senhor de um qualquer alhur onde eu queria ir. Não havia mais ninguém.
Segui-o. No caminho passámos por becos escondidos e ruelas estreitas. Subimos escadinhas e atravessámos jardins para mim desconhecidos. Entrámos num café pequenino onde ele foi acolhido com um boa tarde que soou habitual, ao qual respondeu com um breve aceno distraído, ocupando uma mesa onde logo lhe pousaram dois maços de cigarros e um café. Sentei-me perto e pedi um chocolate quente. Os meus olhos procuraram o livro. Não pude ler o título completo mas o que vi bastou e eu sabia bem as palavras que faltavam, porque as conhecia e eram para mim palavras que se amam.

Então, não sei porquê, ele olhou-me e soube. E trouxe-me a noite e o silêncio.


© Fata Morgana

4 comentários:

Ana Beatriz Frusca disse...

O trecho que escreveste em maio seria um bom começo, mas este, fechou-se com uma frase que considerei essencial:"Então, não sei porquê, ele olhou-me e soube. E trouxe-me a noite e o silêncio."
Já estou ansiosa pela terceira parte.

bjuxxx.

Fata Morgana disse...

:)

Então parabéns muuuuito atrasados!

**beijos**

Jo disse...

Graças à Bia, vim ler o começo. Já tinha gostado, ainda me prendi mais à história. Aguardo também ansiosa a 3ª parte.

:)

beijo*

Fata Morgana disse...

:))

Está bem!

mas vou já avisando que os fragmentos desta história vão saindo assim como se fossem sonhos... Não há dia nem hora para lhe retomar o fio.

Beijo*